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quinta-feira, 5 de julho de 2012

Para os milhares de brasileiros que anualmente usam o Sistema Único de Saúde para iniciar um tratamento oncológico, os desafios vão além (e muito) dos naturais.


Desafios enfrentados pelo paciente com câncer atendido pelo SUS



A jornada de um tratamento para o câncer é desafiadora desde o diagnóstico. O impacto negativo da notícia, a reorganização do dia-a-dia para conciliar a rotina de hospital com trabalho ou estudos, os efeitos adversos do tratamento, a instabilidade emocional. Uma verdadeira ‘reviravolta’ da vida, que somente quem está passando ou já passou por tratamento pode ter noção da dimensão.

O cenário é por si delicado e requer do paciente entender as novas circunstâncias de sua vida para levar o tratamento da forma menos dolorosa possível, sem ‘encerrar-se’ em detrimento da doença, mas respeitando os limites que o corpo impõe.

Embora não haja regras para a passagem pelo tratamento, informar-se sobre a doença, manter uma comunicação clara e irrestrita com a equipe médica, buscar o carinho e amparo das pessoas amadas e seguir à risca as orientações terapêuticas são dicas que o Instituto Oncoguia dá aos pacientes.

Para os milhares de brasileiros que anualmente usam o Sistema Único de Saúde para iniciar um tratamento oncológico, os desafios vão além (e muito) dos naturais.

Para além dos desafios naturais

A Constituição de 1988 determinou ser dever do Estado garantir saúde a toda a população e, para tanto, criou o SUS (Sistema Único de Saúde), que se configura como uma complexa rede de atendimento em que estados e municípios, orientados por um fragilíssimo sistema de regulação, devem garantir atendimento de qualidade aos 190 milhões de brasileiros, dos quais 140 milhões dependem exclusivamente da saúde pública.

Nesse contexto, milhares de pacientes com câncer enfrentam verdadeiras batalhas para conseguir o tratamento. Tratamento que lhes é de direito.

A odisseia, muitas vezes, começa ainda nas unidades básicas de saúde, as ‘portas de entrada’ do sistema, com as dificuldades para conseguir consultas primeiramente com generalistas e, depois, com especialistas e seus respectivos encaminhamentos para exames.

UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE – UBS

Unidade Básica de Saúde é a estrutura física básica de atendimento aos usuários do SUS, onde a comunidade local consegue resolver a maioria dos problemas de saúde, com qualidade e com mais rapidez. Isso porque os problemas de saúde mais comuns passam a ser resolvidos nestas Unidades.

Cada UBS é responsável pela saúde de todos os habitantes de uma determinada região da cidade, chamada de área de abrangência. Todo planejamento das ações de saúde da Unidade é voltado para esta comunidade, entendendo as situações sócioeconômicas e priorizando grupos de risco.

A gaúcha de Porto Alegre, Elaine Aparecida Rosa, 57 anos, é um exemplo: Ela aguarda a cerca dois anos por uma consulta com proctologista. Filha de paciente oncológica (a mãe faleceu ano passado com câncer colorretal) e, portanto, cidadã que deve passar por exames periódicos de rastreamento, Elaine procurou pela UBS de seu Bairro, Vila Cruzeiro (Unidade Básica de Saúde Vila Cruzeiro), em 29 de novembro de 2010, ao sentir fortes dores intestinais e notar pequenos sangramentos ao evacuar.

Atendida por um clínico geral, a paciente que já havia sido operada de pólipos e fissuras intestinais anteriormente, quando era beneficiária de plano de saúde, foi orientada pelo médico a consultar-se com um proctologista, que poderia lhe pedir exames de colonoscopia e sangue oculto nas fezes.

Centrais de marcação de consultas e serviços de apoio diagnóstico e terapêutico

Destinam-se ao gerenciamento das ações de saúde ambulatorial que não têm resolubilidade na Atenção Primária à Saúde, isto é, no encaminhamento do usuário que necessita de consultas com especialistas, de exames especializados ou de terapias. Para garantir aos pacientes a melhor alternativa terapêutica, mesmo em situações de demanda reprimida ou de escassez de recursos do município, é necessária a presença do regulador.

O regulador avalia a necessidade do caso pelo laudo médico, consulta a disponibilidade assistencial mais adequada nas unidades de saúde mais próximas e autoriza a execução dos procedimentos necessários, baseado nas evidências clínicas e na Programação Pactuada Integrada (PPI), se o caso envolver referências intermunicipais. (Regulação em Saúde – Coleção para entender o SUS. CONASS)

Naquele mesmo dia Elaine fez o pedido da consulta na UBS, e a longa espera teve início. Passados quase dois anos, ela ‘bateu à porta’ da administração do posto e teve a notícia de que “por uma razão ou outra, sua consulta não foi marcada” e que teria de aguardar por um novo agendamento.

Ela lembra que em 2010 as dores lancinantes a obrigaram a se automedicar. “Na época do sangramento não tive outra coisa a fazer a não se ir à farmácia pedir socorro. A farmacêutica me disse para usar o Proctyl, e foi o que eu fiz”.

Eliane continuou esperando pela nova data da consulta e, atenta sobre os seus direitos, protocolou reclamação na ouvidoria da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre para, com a carta-resposta em mãos, ‘forçar’ o agendamento da consulta.

A resposta da ouvidoria dizia: (...) Solicitamos que caso o (a) paciente necessite um atendimento de urgência, ele (a) deve procurar a sua Unidade de Saúde de Referência ou um Pronto Atendimento ou Hospital. Se o seu caso for avaliado pelo seu médico da Unidade como urgente terá sua consulta agendada com prioridade. Converse com o seu médico para ver como está a sua situação atual (...).

A carta, generalista, fria, desatenciosa, não apresentou caminhos para a solução do problema de Elaine, mas como o clínico geral do posto já conhecia seu histórico, ela levou consigo o documento para fortalecer o seu pedido.

A paciente entrou em contato com o Instituto Oncoguia contando seu caso e informou que enviara a carta para a ouvidoria no dia 13 de junho. A entidade recebeu e-mail da paciente relatando que conseguiu marcar a consulta para o dia 21 de junho.

Sem tratamento apesar do diagnóstico

São Paulo é o estado brasileiro que apresenta as melhores condições de tratamento aos pacientes do SUS. A iniciativa local da criação da APAC Paulista tem agilizado o ritmo de incorporação de medicamentos e a ampliação dos recursos disponibilizados aos cidadãos.

Ainda assim, histórias de pacientes revelam que há situações gravíssimas acontecendo no estado e, entre as razões, pode estar justamente o tratamento de alta complexidade diferenciado que São Paulo oferece que acaba por atrair pacientes de diversas partes do país causando um ‘inchaço’ no sistema. Não é incomum que pacientes com diagnóstico de câncer demorem três, quatro (...), oito meses para iniciar o tratamento, quando em clínicas particulares de excelência um paciente não demora mais que uma semana para começar uma terapia.

A aposentada Veneranda Caitano Cedon, 51 anos, moradora de Osasco, teve a primeira suspeita clínica de um câncer em 2010, o diagnóstico de Adenocarcinoma tubular de cólon e reto, com metástase de múltiplas lesões hepáticas e pulmonares em fevereiro deste ano e, até poucos dias atrás, antes de recorrer ao Instituto Oncoguia, aguardava para iniciar o tratamento no Centro de Alta Complexidade em Oncologia do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Cacons e Unacons

As unidades de saúde vinculadas ao SUS que realizam tratamento oncológico no Brasil são cadastradas pelo Ministério da Saúde como Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (UNACON) e Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON).

Estes serviços são constituídos por unidades hospitalares que dispõem de todos os recursos humanos e tecnológicos necessários à assistência integral do paciente com câncer, desde o diagnóstico do caso, assistência ambulatorial e hospitalar, atendimento de emergências oncológicas e cuidados paliativos, sendo que nas UNACON é oferecido tratamento para os cânceres mais prevalentesno Brasil e nos CACON, tratamento para todos os tipos de câncer. (Secretaria da Saúde – Governo do Estado de São Paulo).

Nas diversas consultas pelas quais já passou no HC, sempre com diferentes oncologistas, Dona Veneranda não foi informada qual seria seu tratamento e quando este se iniciaria.

O filho da paciente, Ademir Caetano, relata que a saúde da mãe vem piorando diariamente, lembrando que há cerca de 50 dias ela conseguia “fazer algumas coisas”, como cozinhar. “Mas hoje ela só se levanta para ir ao banheiro. Está fraca, sente náuseas, muitas dores nas regiões dos tumores, febres e vômitos constantes”. Nenhuma medicação, nem mesmo para tratar tais sintomas, foi indicada à paciente.

Ademir solicitou ajuda do Instituto Oncoguia no mês de maio e a entidade direcionou o caso paciente ao ICESP. Consulta foi agendada para o início de junho e a primeira quimioterapia marcada para o mesmo mês.

Exame pago em hospital público

O aposentado Almerindo Marques Santos, 69 anos, residente no bairro de Guaianases (SP), sempre cuidou da saúde e nunca se furtou a realizar os exames determinados a cada fase da vida. É forte, saudável.

Em 2009 o exame de PSA detectou uma pequena alteração, que o médico justificou como sendo “coisa da idade”; em 2010, mais um exame alterado e a idade avançada continuara como vilã; no ano seguinte, em novembro, outro exame e o médico lhe deu a guia para uma biópsia, que o aposentado, junto da filha Luzinete, levou prontamente ao Hospital Santa Marcelina de Itaquera.

Pai e filha saíram do hospital sem conseguir agendar a biópsia e retornaram em janeiro e março de 2012, sem sucesso.

Preocupados, resolveram pagar pelo exame e, por surpresa, o Hospital Santa Marcelina de Itaquera, agendou a biópsia para o dia seguinte.

A biópsia diagnosticou o câncer de próstata e a jornada de tratamentos se iniciaria. “Nós acreditávamos que conseguiríamos marcar a consulta com o urologista naquele mesmo dia. Não seria o natural, já que o resultado deu positivo?”, questionou Luzinete. Mas a primeira consulta demoraria ainda três meses a acontecer.

A filha lembra que no dia marcado não pôde acompanhar o pai, que foi sozinho ao hospital. Ele contou que foi absolutamente maltratado pelo médico, que disse, “É, você tem câncer, mas vai ter que esperar na fila para a cirurgia”.

E a nova consulta foi agendada apenas para outubro.

Luzinete: “Fiquei indignada! Entrei em contato com a Secretaria da Saúde, que disse que eu tinha que ir no Posto. Fui no posto, que me disse que não era com eles. Meu Deus! Hospital sabe que meu pai tem câncer. Não fizeram a biópsia nele?”

A família de Almerindo resolveu vender um carro para pagar pela cirurgia, mas foi informada pelo Hospital que, caso pagassem, o paciente não poderia realizar as outras fases do tratamento pelo SUS. A partir da então, a filha Luzinete partiu para ação: enviou e-mail à Secretaria de Saúde contando seu caso, buscou na internet por hospitais particulares com cotas para atendimento ao serviço público e entrou em contato com o Instituto Oncoguia.

A orientação da ONG foi que Luzinete pedisse um encaminhamento médico ao profissional responsável pela biópsia e levasse ao Posto de Saúde a fim de conseguir um relatório para dar entrada no Hospital A.C.Camargo.

A filha marcou a entrevista com a assistente social do Hospital A.C.Camargo, que ouviu o caso de Almerindo e disse que entraria em contato com ela em 15 dias. Ao fechamento desta matéria, o prazo estabelecido não fora comprido, mas o Instituto Oncoguia continua acompanhando o caso.

Questionada sobre a saúde do pai, Luzinete diz que “fisicamente ele está muito bem e nem mesmo parece que tem um câncer”. Porém, Almerindo está muito abalado emocionalmente. “Saiu da casa dele e mudou-se junto de minha irmã. Disse que sozinho não fica. Tem medo de morrer”.

Muitos outros casos

Diariamente o Instituto Oncoguia atende pacientes e familiares com casos semelhantes aos de Eliane, Ademir e Luzinete, prova de que o Sistema Único de Saúde não presta o serviço que é de sua competência, ou de outra forma, o presta de forma inadequada. Enormes filas, dificuldade em marcar exames e consultas e ‘peregrinação’ entre hospitais refletem as falhas nos serviços prestados pelo SUS.

A entidade tentou, por diversas vezes, agendar entrevista com representante da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, para entender, por fim, como funciona o sistema de regulação em saúde no estado e no país; a assessoria de imprensa não atendeu às solicitações.

Regulação em Saúde será um dos temas de debate do III Fórum de Discussão de Políticas de Saúde em Oncologia, que acontecerá no dia 25 de junho, em São Paulo.

Fonte: Equipe Oncoguia

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